Cortes no IFC: cotidiano alterado [EDUCação]

Levantamento aponta que dinheiro retido em maio mexeu no emprego de terceirizados, bolsas estudantis, capacitação de servidores e manutenção dos campi.

Milhares, milhões, bilhões… Olhados de longe, cortes no orçamento são frios como os números tendem a ser. Em maio deste ano o MEC reteve em seu caixa 39% do previsto em verbas de custeio e 30% do orçado para investimentos e capacitações.

Quase R$19,4 milhões de recursos represados das já desabastecidas finanças do Instituto Federal Catarinense, afetadas pelos sucessivos cortes nos governos Temer e Dilma.

Apenas cinco meses depois é que o MEC “descontingenciou” tais valores, dando um breve respiro para que as instituições consigam fechar o ano.

Mas como esses meses em suspensão afetaram a vida de estudantes, servidores e da comunidade que circula diariamente nos vários campi do IFC espalhados em nossa região?

Para se aprofundar neste tema, contactamos as direções das unidades de Araquari, Blumenau, Brusque, Camboriú, São Bento do Sul e São Francisco do Sul. O panorama das mudanças exigidas pela retenção do dinheiro é de precarização na manutenção dos campi, demissão de funcionários terceirizados, renegociação de contratos, recursos escassos para a permanência dos estudantes e zerados para a capacitação dos profissionais.

Terceirizados, onde a corda estoura mais cedo

Em 9 de maio deste ano, o Min. da Educação, Abraham Weintraub, foi o convidado das transmissões ao vivo feitas pelo Presidente Jair Bolsonaro em suas redes sociais.

Na ocasião, o ministro usou bombons para tentar explicar o que fazia com os recursos das Universidades e afirmou: “A gente não está mandando ninguém embora. Se fosse numa empresa, seria difícil, a gente teria que mandar gente embora”.

A frase não é completamente verdadeira. Se docentes e técnico-administrativos dos IFs e Universidades, com estabilidade em seus cargos, permaneceram, o levantamento feito junto aos campi da região aponta que a renegociação de contratos com empresas terceirizadas levou desemprego para várias famílias.

Em Camboriú, 19 pessoas deixaram de prestar serviços para o Campus em setores como limpeza, vigilância e no refeitório da instituição. Outras seis famílias foram atingidas pelos cortes em limpeza do Campus São Chico e uma perdeu a fonte de renda no Campus Brusque.

Isso sem considerar que os cortes dos governos anteriores, a redução nos contratos até o limite legal de 25% do valor inicialmente estipulado e o cancelamento de acordos com fornecedores retiraram outros profissionais de setores como jardinagem e manutenção de aparelhos de ar-condicionado – de acordo com relatos das ações de cortes das direções feitos em Brusque e Araquari.

Capacitações e visitas técnicas, um ano perdido

Por se tratarem de cursos técnicos e profissionalizantes, parte importante da educação prestada pelos Institutos Federais está na interação com casos reais e na atualização dos profissionais para a formação para o Mundo do Trabalho.

Se esse é o caso ideal, 2019 pode ser considerado um ano perdido para servidores e estudantes. Segundo o levantamento feito junto às Direções, todas exceto uma das visitas técnicas agendadas foi cancelada neste ano. A exceção ocorreu em Camboriú, onde uma visita do curso técnico em hospedagem marcada para Balneário Camboriú, cidade vizinha ao Campus, foi mantida.

Nos Campi de Brusque, Blumenau, Araquari e Camboriú houve cortes também na Capacitação prevista para o ano. Nos três últimos casos todas as capacitações foram canceladas.

Permanência estudantil, a juventude prejudicada

Desde que foram criados, há 10 anos, os Institutos tem como meta a interiorização do ensino, levando conhecimentos técnicos para cidades mais distantes dos grandes polos urbanos.

Um dos desafios deste plano é a permanência dos estudantes, muitos deles de um perfil bem distinto dos que acessam as Universidades Federais.

Assim, muitas direções de campi usaram como meio de atração de estudantes para o ensino em tempo integral auxílios como refeição subsidiada. O IFC como um todo conta ainda com políticas de assistência estudantil e bolsas para estudantes em situação mais vulnerável e/ou dificuldade de acesso.

Se por um lado as bolsas já concedidas no início do ano foram mantidas, como a Reitoria do Instituto reafirmou em nota divulgada no mês de outubro, as bolsas do segundo semestre não foram liberadas para nenhum estudante classificado pelo Edital 43/2019 até, ao menos, a segunda quinzena de outubro.

Já para as refeições subsidiadas, o corte atingiu ainda mais estudantes. Em Brusque o auxílio para o almoço de cada estudante era de R$3,60 e em São Chico era total. Agora, os estudantes desses campi não contam mais com esse incentivo.

Prejuízos também são contabilizados nas salas de aula muito quentes ou muito frias, realidade após a proibição do uso dos aparelhos de ar-condicionado permanentemente desligados em cinco das seis unidades pesquisadas.

Manutenção do campus, o foco é acreditar

Os cortes atingem diretamente o presente de mais de uma dezena de famílias que perderam seus sustentos e de estudantes que não contam mais com auxílios e incentivos para acessarem as salas de aula do IFC.

Atingem ainda o futuro de estudantes e servidores que não contam mais com ferramentas pedagógicas que melhoram suas qualificações, como as capacitações profissionais e as visitas técnicas canceladas.

E, por fim, o futuro de laboratórios, salas de aula e aparelhos existentes. Nos Campi pesquisados não há recursos para compras de insumos para laboratórios e até mesmo para troca de lâmpadas. Em São Bento do Sul, por exemplo, a saída foi contar com voluntários para a troca de lâmpadas fluorescentes por outras de LED, mais econômicas.

Nos últimos tempos,o IFC tem se acostumado cada vez mais com a emergência financeira. Diante disso, as Direções locais tentam se virar cada uma a sua maneira para manterem seus portões abertos. A pergunta que a situação dramática do momento suscita é tão cruel como realista: até quando?

Texto publicado na edição 09 (outubro/novembro 2019) do EDUC>ação

Confira os outros textos desta edição do EDUCação:

[Nossa Voz] Limites: de recursos e da inércia

Sindicato lança periódico científico para incentivar produção acadêmica

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