Tijolos doados ajudarão na consolidação da retomada indígena, até o momento crianças e adultos dormem sob lonas e barracas, além de sofrerem ameaças de grileiros da região.
Na madrugada do dia 04 de março, indígenas da etnia Deni iniciaram a retomada na cidade de Araquari, Santa Catarina. A retomada indígena é um processo de luta destes povos por suas terras, as quais ocupavam originariamente.
No dia 24, fomos até a Aldeia Deni Tucumã e conversamos com Dorval Pereira Tavares Filho, um dos líderes da comunidade. Assista à entrevista completa:
Para os povos indígenas a demarcação territorial é condição do resgate da identidade étnica e cultural, além da própria existência destes povos, que há mais de 500 anos lutam contra a colonização, violência e repressão de garimpeiros, madeireiros, grileiros e do Estado.
Naturais do Amazonas, epicentro da pandemia no país, assistiram à morte de muitos parentes ocasionadas pelo descaso da política negacionista de extrema direita. Em Manaus, única cidade do estado do Amazonas com leitos de UTI, o caos foi instalado com a lotação hospitalar e a falta de cilindros de oxigênio, ocasionando no colapso do sistema de saúde.
A política genocida promovida pelo então presidente Jair Bolsonaro, levou terror ao Amazonas, estado com a terceira maior letalidade do país em Covid-19, de 2,3%, em contraste com Santa Catarina, menor letalidade do país, com 1,1%¹.
Por isso, dois anos antes da retomada, em março de 2021, os membros da família Deni decidiram recomeçar a vida em Joinville, Santa Catarina. Com o pouco dinheiro que possuíam, se instalaram em um terreno no bairro Fátima. O terreno foi comprado por 7 mil reais através da OLX, aplicativo de vendas, onde construíram sua casa.
Semanas depois foram surpreendidos pela violência policial. A ação, coordenada pela prefeitura de Joinville, tinha como objetivo o despejo dos indígenas, onde viviam 12 crianças e 22 adultos. O conflito se deve porque o terreno se encontra em Área de Preservação Permanente (APP)².
Movimentos sociais e de direitos humanos e a defensoria pública estadual atuaram na defesa dos indígenas. Ainda assim, a casa foi invadida pela força policial de maneira bruta, com bombas e spray de pimenta lançado contra as crianças³.
A casa ainda não foi derrubada. No momento o caso se encontra na justiça.
As marcas das constantes violências policiais, do racismo e da xenofobia afetaram profundamente a família. Eis que surge uma alternativa: a retomada de terras da União na cidade de Araquari / SC.
O objetivo desta retomada, segundo os Deni é “manter a floresta de pé” e “voltar a viver da terra que é nossa por direito originário, a fim de garantir a manutenção da nossa cultura fora dos centros urbanos” ⁴.
Contando com o apoio dos movimentos sociais, da assistência da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) e do Ministério Público Federal (MPF), a retomada teve início, mas não sem suas dificuldades.
A aldeia Deni Tucumã marca a possibilidade de uma nova vida digna, de manutenção da identidade cultural e de preservação da floresta, longe do caos urbano e da violência policial.
Contudo, o interesse dos grileiros da região são outros. São inúmeros os relatos de investidas de particulares contra a retomada. Ameaças verbais por advogados, empresários do ramo imobiliário e seus capangas armados têm acontecido desde o dia 04.
No momento, crianças, mulheres e homens adultos se encontram trabalhando na terra. Ainda sob teto de lona e barracas, sem água e luz, necessitam da solidariedade de toda a comunidade.
Nas últimas semanas a Seção Sinasefe Litoral fez a doação de aproximadamente mil reais em materiais de construção em apoio à retomada Deni.
A Aldeia Deni Tucumã segue necessitando de apoio e doações para a construção, como: madeira, caibro, água, gerador de energia elétrica, pregos, fio de luz e folha de telha. Doações também são recebidas por meio do pix: deni.tucuma@gmail.com. Apoie.
É possível acompanhar a Aldeia Deni Tucumã nas redes por meio do perfil no instagram @denitucuma.
Notas:
[1] Dados obtidos no Painel do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS). Disponível em: https://www.conass.org.br/painelconasscovid19/.
[2] Com informações da Defensoria Pública de Joinville. Disponível em: https://www.defensoria.sc.def.br/noticias/defensoria-publica-de-joinville-questiona-municipio-sobre-ordem-de-despejo-de-indigenas-no-bairro-fatima.
[3] A história da família de etnia Deni em Joinville, Santa Catarina, está registrada no documentário Vivemos Aqui, ganhador do Prêmio de Jornalismo em SC. Disponível em: http://vivemosaqui.com.br/.
[4] Com informações de Carta aberta da retomada indígena do povo Deni em Araquari (SC) — Repórter Popular. Disponível em: https://reporterpopular.com.br/carta-aberta-da-retomada-indigena-do-povo-deni-em-araquari-sc/.