Evento nesta terça, 19, iniciou debates que agora seguirão para cada Campus do IFC. Rodada de eventos é para dar subsídios para Conselho Superior da entidade decidir adesão ao programa
O dia 19 começou a discussão institucional sobre um dos mais polêmicos e questionáveis programas lançados pelo Ministério da Educação, o Future-se.
Polêmico pelo contexto em que foi lançado, em torno de acusações de “balbúrdia” pelo Ministro da Educação, cortes de verbas do MEC e protestos populares.
Questionável por ser, na analogia feita pelo Pró-Reitor do Instituto Federal do Espírito Santo, Luciano de Oliveira Toledo, um iceberg: há muito mais submerso do que acima da superfície, onde podemos enxergar.
O evento da manhã, aberto à comunidade, teve como convidado, além do Pró-Reitor do IFES, que participou por videoconferência, de Anderson André Genro Alves Ribeiro, professor da Universidade Federal da Fronteira Sul vencedor do último pleito da Universidade para eleição de Reitor, mas preterido pela gestão Bolsonaro em detrimento de Marcelo Recktenvald, professor simpatizante do atual governo.
A mediação foi realizada pelo professor Fernando Braz, do Campus Araquari do IFC. A mesa foi composta também pela Reitora do Instituto, Sônia Regina Fernandes da Silveira.
Toledo vê melhoria na 2ª versão do projeto
Após a abertura dos trabalhos, foi Toledo que iniciou o debate sobre o Future-se. De acordo com o professor que tem em seu currículo passagens pelo MEC entre 2011 e 2015 e pela presidência da Fundação de Apoio de direito privado Facto, que presta serviços ao IFES, houve melhorias na segunda versão do programa, apresentada pelo governo em outubro deste ano.
Defensor das parcerias público-privadas e da gestão por meio das Fundações de Apoio, Toledo apresentou o ponto de vista gerencial do projeto.
Segundo ele, partiu do IFES a articulação para questionar as inconstitucionalidades da primeira versão do projeto. O relato de Toledo é de que um Grupo de Trabalho formado por procuradores ligados aos IFs e às Universidades Federais, junto a Procuradoria Jurídica do MEC, participaram ativamente das mudanças para a segunda versão.
Entre as mudanças elencadas, destaque para a saída do eixo de “gestão e governança” antes presentes na proposta e do caráter de verba adicional, e não mais como financiamento primordial das instituições federais de ensino.
O próprio Toledo, no entanto, ressalta a ‘armadilha’ nas duas mudanças: se as verbas iniciais de custeio e investimento das instituições são discricionárias, aquelas que o governo tem poder para escolher como e onde serão aplicadas, cortes mais profundos de recursos poderiam forçar a adesão ao Future-se, tornando o “aditivo” fonte essencial das instituições.
Já a governança e gestão, retiradas em respeito à Constituição quando trata da autonomia universitária, estaria presente de maneira transversal no documento.
Ribeiro contextualizou origem do programa e alertou para Fundos presentes nas duas versões
O que significam os Fundos patrimonial e soberano presentes no Future-se? Se para Toledo ainda não está claro para que eles vieram, para o professor do UFFS todo o programa Future-se gira justamente em função deles.
Segundo ele, todas as medidas colocadas como “transformadoras” e “para o futuro” do programa são em maior ou menor medida já existentes nas instituições federais. Para Anderson, o intuito do discurso da gestão do MEC busca iludir as pessoas em torno da ideia de que IFs e Universidades não querem ser transparentes, empreender ou inovar, quando isso já ocorre.
A partir disso, ele alerta para a real função do programa: aprovar a existência de Fundos da Educação com ações na bolsa de valores. A ideia é complexa, mas pode ser resumida da seguinte forma: um fundo patrimonial e outro fundo soberano são criados. Parte do investimento obrigatório do governo federal em educação pode ser repassado para estes fundos, contando como se de fato estivesse sendo investido nesta área. Dali, tais recursos seriam controlados por um banco, contratado sem a necessidade de licitação, de acordo com o Projeto de Lei do Future-se, para aplicar esse dinheiro em instituições ligadas a Educação como, por exemplo, universidades particulares com capital aberto.
Como contrapartida para esse verdadeiro desvio dos recursos das instituições públicas para as privadas, uma pequena porcentagem dos ganhos seria revertido para as instituições nas áreas do empreendedorismo e no fomento de start-ups, por exemplo.
Nos fundos patrimoniais, parte dos recuros viriam da precificação dos imóveis das instituições, que passariam a ser “ativos” no mercado de valores.
Para Braz programa não trata de educação
Fernando Braz, que mediava o debate, trouxe um elemento de sua área de atuação, a mineração de dados, para compreensão do programa.
O professor da área da tecnologia passou o documento por um filtro que buscou os termos mais utilizados em todo o texto. Enquanto contrato e desempenho apareceram mais de vinte vezes cada e empreendedorismo 12 no total, Plano Nacional de Educação e extensão não foram citados. O termo “mercado” apareceu cinco vezes no texto, o que dá a dimensão de que o programa trata dele e não de educação, argumentou Braz.
Braz já havia participado do debate feito pelo Sindicato sobre o programa. Leia mais.
Reitora quer fortalecer debate
Sônia Regina de Souza Fernandes acompanhou todo o evento compondo a mesa. Logo no início, apresentou a ideia do Grupo de Trabalho que discute o projeto no âmbito do IFC e pontuou que será o Conselho Superior do Instituto, instância mais alta de decisão da instituição, quem tomará uma decisão sobre a adesão ou não ao programa.
É neste sentido que o GT organiza trabalho de suporte para que a comunidade do IFC como um todo esteja informada e preparada para discutir o projeto.
Reunião da tarde estabelece próximos passos
O segundo espaço para discussão dos Programas Future-se e Novos Caminhos ocorreu na tarde desta terça com a presença de representantes de diversos Campi do IFC. Como próximas atividades programas estão web conferências com Direções Gerais, de Ensino e de Administração e Patrimônio dos Campi, além de atividades descentralizadas para discussão dos Programas com estudantes, professores e técnico-administrativos em educação. Uma nova reunião do GT ficou marcada para o dia 11 de dezembro.
* Pelo seu lançamento recente, pouco se tratou do Programa Novos Caminhos, que trata especificamente do ensino técnico e de sua expansão.