PERSPECTIVA DE BASE: Michel Silva debate divisões do atual movimento sindical brasileiro e o que é possível fazer para caminhar em direçao à unidade das organizações dos trabalhadores
por Michel Goulart da Silva¹
Nos últimos anos verificou-se uma grave crise no movimento sindical no Brasil. Por um lado, a CUT, principal central sindical, tem se apresentado como um aparato burocrático utilizado para barrar as lutas dos trabalhadores, embora ainda reúna em sua base o grosso do movimento operário. Por outro, as pequenas centrais dissidentes da CUT, como a CSP-Conlutas e a Intersindical, reúnem uma pequena parcela dos trabalhadores brasileiros e se mostraram incapazes de se constituírem como espaços de organização para a classe.
Os desafios colocados pelo governo Bolsonaro apontam para a necessidade da mais ampla unidade de ação e luta entre os diversos setores, superando o imobilismo das principais direções. O drama da crise de direção dos trabalhadores raras vezes se mostrou tão claramente.
O marco simbólico dessa crise pode ser relacionado ao primeiro ano do governo PT, em 2003. Em sua política de construir um grande pacto nacional, o presidente Lula constituiu o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, que tinha como objetivo reunir os trabalhadores e a burguesia para que discutissem e negociassem interesses que supostamente não seriam antagônicos. Ou seja, a CUT e outras direções dos trabalhadores deveriam discutir com representantes dos grandes capitalistas formas de minimizar os efeitos dos ataques a serem promovidos pelo governo Lula.
O processo de cooptação das direções dos trabalhadores, com a CUT à frente, se manifestou no embate contra a chamada “reforma da previdência”, que atacava principalmente a aposentadoria dos servidores públicos. Enredada nas tramas do governo Lula, a CUT optou por tentar deixar menos pior a proposta ao invés de combater seu texto na integralidade. O PT, por sua vez, foi agente direto desse ataque aos trabalhadores.
Essa política desastrosa teve como consequência uma série de rupturas. No âmbito da política mais geral, os parlamentares “radicais” do PT que votaram contra o projeto de reforma da previdência foram expulsos do partido, vindo a fundar o PSOL em 2005. No campo sindical, em 2004 constituiu-se a Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas) como espaço de aglutinação de sindicatos e demais entidades em luta, reunindo parcela significativa dos setores de oposição ao governo Lula. Parte dos setores que participavam desse espaço, em especial o PSTU, defendia uma política de desfiliação dos sindicatos da CUT e a construção de uma nova central. Em 2006 a Conlutas se transforma em central sindical, principalmente por conta dos interesses materiais desse setor da burocracia sindical.
Contudo, a construção desses novos espaços não significou uma efetiva reorganização dos trabalhadores, mas somente a criação de aparatos artificiais. O melhor exemplo é a Intersindical, que, mesmo se colocando como uma central, não tem qualquer relevância no movimento. Passados tantos anos, a despeito das traições e do imobilismo de sua direção majoritária, a esmagadora maioria dos trabalhadores permanece na base da CUT.
No que se refere aos operários, somente centrais ligadas a partidos burgueses, como Força Sindical e UGT, possuem alguma inserção significativa além da CUT. No caso da CSP-Conlutas, embora tenha conseguido filiar alguns poucos sindicatos operários, seu maior peso político encontra-se no funcionalismo público federal, reunindo entidades de grande relevância nacional, como o sindicato dos docentes universitários (ANDES) e o SINASEFE, além de pequenos sindicatos regionais.
PERSPECTIVA DE BASE:
Seção do site dá espaço às opiniões dos filiados ao Sindicato
O cenário geral apresenta três segmentos de centrais sindicais. Uma central de massas ligada ao PT (CUT), cuja direção aposta na conciliação de classes. Um conjunto de centrais com relativa inserção ao movimento operário, mas que são ligadas diretamente a partidos burgueses (UGT, Força Sindical, entre outras). E pequenas centrais ligadas a partidos de esquerda (CSP-Conlutas e Intersindical) que não possuem uma grande inserção no movimento operário, conseguindo no máximo mobilizações isoladas e de pouco impacto para o conjunto da luta, restringindo-se a uma influência parcial no funcionalismo público. Em suma, não existe hoje segmento do movimento sindical que tenha, ao mesmo tempo, capacidade mobilização e disposição de luta enquanto direção dos trabalhadores.
Portanto, há uma urgente necessidade de reunificação dos trabalhadores pela base, com ou sem o apoio das direções, com vistas à construção de uma greve geral. Os trabalhadores precisam romper as amarras com os aparatos burocráticos e, além de construir unidades pontuais, também precisam articular um espaço centralizado que organize a maior parte da classe.
A CUT foi conivente com um dos mais profundos ataques ao funcionalismo público, a reforma da previdência de Lula, levando setores de massas, como professores e técnicos das universidades, bem como trabalhadores do INSS e de outras categorias, a criarem ódio pela direção da central. Uma parcela desses segmentos deixou a CUT, uma ação que, a despeito de sua legitimidade, em diversos contextos tem isolado os seus sindicatos das mobilizações mais gerais da classe.
Para superar isso, uma das propostas que vem sendo discutidas é a organização de um Encontro Nacional da Classe Trabalhadora (ENCLAT), inclusive como resolução congressual do SINASEFE. Esse encontro (ou congresso) seria constituído por delegados eleitos nas bases dos sindicatos, do movimento estudantil e dos movimentos sociais, para unificar uma pauta de reivindicações e para organizar a luta contra os ataques que vem sendo implementados pelos governos e pela burguesia.
Esse encontro poderia colocar em pauta a construção de uma nova central, controlada pela base e que não fosse uma resposta aos interesses materiais das burocracias. Esse espaço pode vir a significar uma nova experiência de articulação e mobilização, expressando os anseios mais sentidos pelos trabalhadores e pela juventude e, a partir disso, construindo uma nova direção para o movimento sindical que supere os limites das atuais burocracias.
Somente a unidade dos trabalhadores e da juventude poderão barrar os ataques do governo Bolsonaro e da burguesia!
1 – Michel Silva é Doutor em História pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Realizou estágio pós-doutoral no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Técnico em Assuntos Educacionais do Instituto Federal Catarinense (IFC). Possui graduação e mestrado em História pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Tem experiência na área de História, com ênfase em História do Brasil Contemporâneo, atuando principalmente nos seguintes temas: ditadura no Brasil, modernização, marxismo e cultura política.
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