Fórum que reúne dirigentes de ensino dos Institutos Federais enviou nota ao CONIF, Colegiado dos Reitores dos IFs, criticando estrutura de Seminário organizado pelo MEC que deveria debater mudanças da Reforma. “Coube a nós a tarefa exclusiva de ‘colaborar’, ‘adequar’ e ‘melhorar’ os pontos apresentados pela SETEC/MEC”, afirmam.
O avanço dos efeitos da Reforma do Ensino Médio levada a cabo pelo governo Temer vem preocupando os dirigentes dos Institutos Federais do país. É o que demonstra a carta enviada pelo Fórum dos Dirigentes do Ensino (FDE), órgão que reúne os Pró-Reitores de Ensino da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, ao CONIF, entidade dos Reitores dos IFs do país.
O ponto essencial de crítica é à falta de debate que vem acompanhando a implantação da Reforma no país. A ausência de diálogo com os próprios Pró-Reitores que, futuramente, serão os responsáveis pela aplicação das mudanças pretendidas pelo governo Temer pode ser vista, novamente, durante a realização do Seminário “Desafios e Perspectivas no Itinerário de Formação Técnica e Profissional no Ensino Médio”, organizado pela Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação (SETEC-MEC) entre os dias 25 e 26 de setembro.
Reunindo órgãos de Educação Pública e Privada, como as Secretarias Estaduais de Educação, representantes dos IFs e CEFETs, da rede privada de educação profissional e do Sistema S (Senai, Sesi, Sesc, entre outros), o evento fora marcado para discutir as mudanças inclusas pela Reforma no que vem sendo chamado de “5º itinerário formativo”, que inclui a Educação Técnica na formação do estudante de Ensino Médio.
O evento, no entanto “não possibilitou uma discussão qualificada sobre temas importantes e controversos para a educação profissional, tais como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a implementação do itinerário de formação técnica e profissional pelo sistema de ensino, as novas diretrizes curriculares para a educação profissional”, afirmou, na carta, o Fórum de Pró-Reitores.
De acordo com o Fórum, o Seminário foi composto de apresentações em um plenário geral e dinâmicas em grupo, contando com três palestras, apenas uma delas com abertura para questões, feitas por escrito.
Nas dinâmicas, a metodologia também não abira espaço aos debates de fundo sobre a Reforma, dando foco maior ao aperfeiçoamento dos tópicos definidos pela gestão do MEC. “Coube a nós a tarefa exclusiva de ‘colaborar’, ‘adequar’ e ‘melhorar’ os pontos apresentados pela SETEC/MEC, gerando descontentamento entre os participantes da Rede Federal”, afirma a carta do Fórum, que compareceu em grande peso no evento.
“Itinerário formativo”
Na Reforma do Ensino Médio, aprovada como a Lei 13.415/2017, os estudantes passariam a poder escolher áreas de maior interesse para se aprofundarem durante o Ensino Médio, criando individualmente seus “itinerários formativos”. Críticos à Reforma apontam que, apesar de o texto da Lei estabelecer cinco itinerários (Linguagens e suas tecnologias, Educação Profissional, Matemática e suas tecnologias, Ciências Naturais e suas tecnologias, Ciências Humanas e suas tecnologias e Educação Técnica e Profissional), boa parte das escolas não oferecerão todos os itinerários. Além disso, a escolha sobre quais itinerários serão oferecidos caberá às Secretarias de Educação de cada estado, o que pode aumentar o desequilíbrio na formação do país.
PROPOSTA SEM PARTICIPAÇÃO DOS IFs ESTÁ PRONTA PARA SER APROVADA A TOQUE DE CAIXA
Causou ainda mais preocupação aos Pró-Reitores presentes a apresentação do membro do Conselho Nacional de Educação (CNE) do MEC e relator da minuta de Diretrizes Curriculares para a Educação Técnica e Tecnológica, Rafael Lucchesi.
Marcada para o segundo e último dia do evento, a manifestação de Lucchesi trazia os pontos principais das novas Diretrizes, que dará as bases para aplicação da Reforma no quinto itinerário.
Embora o Conselheiro tenha dito em sua apresentação que aquela minuta teria sido “amplamente discutida”, de acordo com os Pró-Reitores presentes, cerca de 90% do total dos Pró-Reitores dos IFs, as novas diretrizes eram, até então, desconhecidas por todos. “Em nenhum momento o FDE tomou conhecimento ou foi chamado para participar dessa discussão”, afirma a Carta.
O Seminário repetia, assim, a maneira como a reforma vem sendo tocada pelo governo Temer. Com pautas-surpresa apresentadas em espaços sem chance ao contraditório.
Quem é Rafael Lucchesi?
Antes de assumir assento no CNE durante a gestão Temer/Mendonça Filho (DEM-PE), Rafael Esmeraldo Lucchesi Ramacciotti tem longa ficha de serviços prestados ao Sistema S (SENAI e SESI) e à Confederação Nacional da Indústria (CNI). Entre 2003 e 2006 foi Secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação no governo Paulo Souto (PFL, atual DEM).
Mais preocupante ainda, de acordo com os Pró-Reitores, é que a minuta estabeleça “mudanças significativas, que trazem forte impacto na Rede Federal”, e que, de acordo com Lucchesi, esteja no plano do governo aprová-la no Conselho Nacional de Educação ainda em novembro deste ano.
Para efeito de comparação, a Carta do FDE relembra que a construção das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Profissional Técnica de Nível Médio, aprovada como a Resolução CNE/CEB nº06 em 2012, levou mais de três anos para ser concluída.
“Não há perspectiva operacional de implantação [das novas diretrizes] sem a articulação das metas com ações de formação de professores, investimento em laboratórios, desenvolvimento de currículos e a própria articulação dos interesses dos estudantes com as perspectivas do mundo do trabalho”, afirma a Carta.
“Podemos concluir que, ainda que pelas regras e propostas do governo, não há substância técnica e política que permitam a implementação do quinto itinerário, o que era esperado, já que reformas são processos e não atos, e como tal, são complexos, contextualizados e contínuos, demandando negociações e articulações, significados, validação social, em passos sequenciais, o que endossa ainda mais a preocupação deste Fórum com a elaboração de novas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Profissional Técnica de Nível Médio sem amplo debate”, complementa a Carta.
Para o Fórum, o processo levado à cabo pelo MEC reduz a Rede Federal “ao papel de mera executora de políticas construídas a sua margem, sem diálogo e respeito ao protagonismo que vem sendo construído nos últimos anos”, o que é visto como um desrespeito aos Institutos, líderes nos índices de educação nacionais e internacionais há vários anos.