Romero Jucá (MDB-RR), que já havia apresentado queixa-crime contra a servidora, quer agora ser indenizado pelos questionamentos feitos pela assistente social do Instituto Federal Catarinense em vídeo que viralizou no final do ano passado.
Corre na Justiça do Distrito Federal processo de indenização por danos morais de autoria do Senador Romero Jucá contra a assistente social do IFC, Rúbia Sagaz. Em novembro do ano passado, Rúbia gravou o encontro que teve com o Senador durante voo entre Brasília e São Paulo. Na época, o vídeo ganhou grande repercussão pelos questionamentos enfáticos feitos ao Senador.
Jucá, também conhecido nas listas de propinas da Odebrecht pelo codinome ‘Caju’, compôs junto com Sergio Machado, ex-presidente da TransPetro, um dos diálogos grampeados mais emblemáticos da história da República. No áudio, de 2016, Jucá afirmava ser necessário “estancar a sangria” provocada pela Operação Lava-Jato e, ao ouvir de Machado que a solução seria “botar o Michel [Temer, na presidência] num grande acordo nacional”, o Senador completa: “com o Supremo, com tudo”. Desde então, vem sendo um dos alvos principais da indignação popular causada pela condução do governo de seu aliado e colega de partido Michel Temer.
O processo por danos morais estipula o valor de R$50 mil a pedido do autor da ação, que considera o valor suficiente para aplacar o sofrimento psicológico causado pela divulgação do vídeo, além de ter também “função punitiva e possa servir como desestímulo a novas ofensas”, de acordo com a argumentação inicial do advogado do autor, Renato Oliveira Ramos, disponível no site da Justiça do DF.
“Se ele tivesse argumentos para responder não precisaria me processar”, afirma Rúbia
Para Rúbia a ação do Senador não tem cabimento. Segundo ela, o processo por danos morais está baseado na ideia de que ela havia acusado Jucá de fazer acordos espúrios e ter amigos canalhas, além de ter se gabado de seu ato e de ter dado entrevistas sobre o ocorrido nos dias seguintes. “É verdade que eu publiquei na minha página e falei depois, o que não é verdade é que eu acusei ele. Eu questiono ele sobre um acordo que é ele quem cita, ele quem fala essa palavra pela primeira vez. Essa palavra ficou conhecida através do aúdio [grampo da PF]. Eu questiono então se eles estão fazendo esses acordos para aprovar a Reforma da Previdência, se esse acordo foi utilizado para aprovar a Emenda Constitucional 95, que congelou os gastos públicos por vinte anos… É isso que eu falo”, afirma. E completa “É claro que eu falo em tom de cobrança, claro que eu não estou num diálogo comum, porque foi esse acordo que ficou conhecido que tem tirado direitos dos trabalhadores, e esse áudio a gente tem visto como tem sido uma profecia”.
Para Rúbia, “se ele tivesse argumentos para responder ele não precisaria estar me processando agora por danos morais. Como uma figura pública sendo questionada, ele poderia ter me respondido, mas ele preferiu não fazer nada disso”. Ela também considera que o Senador está utilizando o processo para tentar calar as vozes que discordam das ações de políticos como ele: “Agora ele está utilizando da justiça para me silenciar de alguma maneira. Silenciar não só a mim, mas que sirva de exemplo para outras pessoas também”.
A assistente social lembra ainda que a gravação feita por ela mostra o Senador tentando agredi-la para tomar o celular de suas mãos: “Teve a tentativa de tirar meu celular, e quem sabe até de me dar uns tapas, eu não duvido disso, mas no momento ele não pode fazer isso por que o pessoal no avião se manifestou dizendo ‘ó, tu não vai bater em mulher’. Como ele não fez isso naquele momento agora a maneira que ele pode mostrar o poder dele sobre mim é utilizando a justiça. Eu sinto que é isso que está por trás”.
Solidariedade
Desde que tomou ciência do processo contra a servidora, diversas pessoas e instituições já se posicionaram em favor de Rúbia, solidarizando-se com ela contra o ataque jurídico do Senador. O SINASEFE, Sindicato dos Servidores dos Institutos Federais, no qual Rúbia mantém filiação, colocou sua Assessoria Jurídica de prontidão para auxiliá-la.
Diversas Seções locais do mesmo Sindicato também se manifestaram em solidariedade, assim como indivíduos que sofreram situações semelhantes nos últimos tempos. A Seção Litoral, seção local do SINASEFE de que Rúbia faz parte, também aprovou em Assembleia de Filiados uma Campanha de Solidariedade à Rúbia e auxílio em questões financeiras que forem necessárias.
Queixa-crime
No início deste ano, Jucá já havia entrado com uma ação contra a servidora do Instituto. Naquela ocasião, no entanto, a denúncia de queixa-crime que ele apresentou contra Rúbia não foi aceita pelo Juiz da 12ª Vara de Justiça do Distrito Federal, Marcus Vinícius Reis Bastos.
Em sua decisão contrária ao Senador, o juiz afirmou que qualquer cidadão tem o direito de questionar políticos, mesmo que em tom de cobrança, a respeito de qualquer fato divulgado, sobretudo em relação a temas tão desabonadores que têm sido amplamente divulgados pela mídia e que a prática, portanto, não constitui crime.
“Canalhas”, “imbecil” e “palhaço”, palavras de Jucá contra seus desafetos
Antes da gravação durante o voo, ocorrida em novembro do ano passado, o próprio Jucá utilizou afirmações fortes contra a imprensa e contra o ex-Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, durante entrevista à rádio 93 FM de Roraima, de propriedade da filha dele, Marina de Holanda Menezes Jucá.
Na ocasião, o Senador dedicou quase 40 minutos para defender os filhos, Marina e seu irmão e ex-deputado Rodrigo Jucá, além de suas enteadas, depois que a PF os indiciou por crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no caso da venda superfaturada de uma fazenda cujo terreno, mais tarde, foi usado para construir um empreendimento do programa Minha Casa Minha Vida.
Na mesma entrevista, relembrou o episódio com Sérgio Machado: “Um ano eu fui atacado, o Jornal Nacional, todo dia aqueles canalhas da Globo bateram em mim”, afirmou. Jucá também atacou Janot, que tinha apresentado três denúncias contra o senador na véspera de deixar o cargo: “esse palhaço desse Janot, um mês antes, 15 dias antes de sair, ele teve de dar um despacho se dobrando ao relatório da PF, dizendo que não tinha nada de errado, que eu não tinha feito nem falado nada de ‘parar a Lava Jato'”.
O mesmo Senador, agora profundamente abalado psicologicamente pelo vídeo em que é questionado por uma servidora, completa, ainda sobre Janot: “Ao contrário, eu ajudei a aprovar aquele imbecil na recondução dele do Senado, mas não sabia que ele era tão imbecil a esse ponto”.
Advogado de ação atuou junto à Cunha na Câmara
Fato curioso na ação movida por Jucá é o advogado que acompanha o caso por parte do Senador. Renato Oliveira Ramos tem entrada nos círculos da cúpula do MDB desde muito antes do Partido retornar à velha sigla sem o P.
Entre outras ações de vulto, Ramos foi assistente técnico da presidência da Câmara dos Deputados durante os últimos meses de Dilma Rousseff na presidência. Tido como advogado de confiança de Eduardo Cunha, atualmente preso em decorrência das ações da Lava-Jato, ele exerceu o cargo a partir de dezembro de 2015, mesmo mês em que Cunha recebeu o pedido de impeachment contra a presidenta.
Meses depois, Ramos foi deslocado para atuar junto à liderança do PTB e auxiliar o então relator do processo de impeachment na Câmara, Jovair Arantes. Na época, disse não ver problema em ser advogado de Cunha e auxiliar o relator do processo de impeachment. Para ele, “o fato de advogar para um ou outro não vincula qualquer outro trabalho que eu vá fazer”, declarou em entrevista à Folha de São Paulo.
Transcorridos mais alguns meses, Ramos passou a ser responsável pela defesa do então PMDB e de seus filiados em causas eleitorais quando Gustavo do Vale Rocha, assumiu funções na Casa Civil do governo de Michel Temer. O dia da assinatura do contrato com o Partido? 1º de setembro de 2016, um dia após a votação do Senado decretar o fim do governo Dilma.
O advogado também visitou Cunha por pelo menos duas vezes na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, e advoga para o ex-deputado em ações movidas por Cunha contra jornalistas e contra o ex-deputado Anthony Garotinho, desafeto do presidente da Câmara, entre outros casos.