[PdB] O projeto “Future-se” e os Institutos Federais: o desmonte da educação profissional e tecnológica pública no Brasil (Parte I)

por Rodrigo Lima¹

No último dia 16 de julho o programa intitulado “Institutos e Universidades Empreendedoras e Inovadoras – FUTURE-SE” foi apresentado a reitores e reitoras das universidades e institutos federais. O Ministro da Educação, Abraham Weintraub, após sucessivas crises no MEC, revelou o projeto educacional do Governo Bolsonaro para o ensino superior e para a educação profissional e tecnológica ofertados por instituições federais de ensino.

Tal projeto foi apresentado no contexto de uma das maiores crises financeiras da história das universidades e dos institutos federais. No final do mês de maio o MEC anunciou o corte orçamentário de R$ 5,8 bilhões, o que corresponde a cerca de 30% dos recursos destinados para o pagamento de despesas discricionárias (água, luz, telefone, segurança, limpeza, etc…). O que implicará no colapso e no fechamento de câmpus e unidades nos próximos meses, devido a impossibilidade de manter serviços básicos em funcionamento.

Tal corte, que até o momento não foi revertido, ocorre em um contexto de vigência da Emenda Constitucional 95/2016, que impõe um teto de gastos do governo federal para os investimentos sociais pelos próximos 20 anos, o que já tem surtido impactos negativos, e que pelo seu teor levará a inviabilização das instituições federais de ensino no curto e médio prazo.

Os gastos do governo federal em custeio e investimentos na educação têm sofrido reduções sucessivas desde o ano de 2015, quando da implementação da política de austeridade durante o segundo mandato presidencial de Dilma Rousseff (PT), coordenada pelo então ministro da economia, o banqueiro Joaquim Levy.

Após o Golpe judicial-midiático-parlamentar de 2016, a agenda neoliberal foi mantida pelo governo golpista de Michel Temer (MDB), alicerçada no programa “Ponte para o Futuro” e atualmente está sendo aprofundada de forma dramática pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL).

Segundo levantamento do Portal G1, a verba para custeio e investimentos deste ano será a menor desde 2008. Fonte: G1/Tesouro Nacional

Os cortes orçamentários sucessivos levaram a aceleração da precarização e do sucateamento das universidades e institutos federais. O cenário torna-se ainda mais devastador com a implementação de uma agenda ultraliberal na economia no país, que visa o avanço da agenda de privatizações, articulada ao projeto neofascista que tem como um de seus pilares a destruição da pesquisa, da ciência e do pensamento crítico no país, sob a bandeira do combate ao “marxismo cultural”.

As universidades e os institutos federais estão na “linha de tiro” do governo Bolsonaro, como instituições a serem enfraquecidas e destruídas, para que o modelo de educação elitista, conservador e privado possa se consolidar no Brasil.

Esse é o grande pano de fundo do projeto “Future-se”, que se apresenta com um falso discurso de inovação e modernização, mas que representa um dos maiores ataques à educação pública da história do país.

O “Future-se” e os Institutos Federais

Os atuais 38 Institutos Federais foram criados no ano de 2008, durante o segundo mandato presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), substituindo os antigos 31 Centros Federais de Educação Profissional e Tecnológica (Cefets), as 75 Unidades descentralizadas de ensino (Uneds), as 39 escolas agrotécnicas federais, as sete escolas técnicas federais e oito escolas vinculadas às Universidades.

Após mais de dez anos da implementação da Rede Federal de Educação Profissional Científica e Tecnológica, os IFs possuem uma estrutura de 644 campi, presentes em 514 municípios brasileiros, distribuídos em todas as regiões do país. Oferecendo 10.643 cursos e contando com 947.792 estudantes matriculados, além de uma força de trabalho de cerca de 80 mil servidores, entre docentes e técnico-administrativos em educação².]

Neste contexto da educação profissional e tecnológica, com suas especificidades e diferenças em relação às universidades federais, os impactos do “Future-se” podem ser ainda mais devastadores.

O “Future-se” acabará com a autonomia administrativa, patrimonial, financeira e didático-pedagógica dos IFs ao propor que Organizações Sociais (OSs) possam, entre outras coisas, captar e gerir recursos privados a serem destinados para investimentos nos Institutos; gerir os patrimônios imóveis dos IFs e apoiar a execução de planos de ensino, pesquisa e extensão (Art. 4º). O projeto de lei prevê, inclusive, a instalação de escritórios e representações das OSs nas dependências dos IFs (Art. 3º), criando uma estrutura paralela de gestão, que na prática prevalecerá sobre a reitoria e as direções dos câmpus.

O projeto, ao não prever a continuidade do financiamento público, sinaliza para que a manutenção das universidades e dos institutos ocorra conforme a capacidade das instituições captarem recursos junto às empresas, via mediação das Organizações Sociais.

Aqui se coloca uma questão importante, o nível de investimento em pesquisa e inovação das empresas brasileiras é baixíssimo. O setor privado investe muito pouco e quando o faz é através de subsídios e aporte estatal. A última Pesquisa de Inovação realizada pelo IBGE no ano de 2014, revelou que 64% das empresas brasileiras não investem um centavo em pesquisa e inovação.

No cenário de crise econômica, com um contínuo processo de desindustrialização do país, de desmonte das empresas públicas (que são vetores do desenvolvimento e financiamento de pesquisas e inovação) e de um empresariado que não investe em pesquisa, o modelo de financiamento privado proposto pelo “Future-se” acarretará no definhamento das universidades e institutos federais.

Confira a segunda parte do texto publicado aqui

1 – Rodrigo Lima é professor de Sociologia no Campus Araranguá – IFSC. Mestre em Sociologia pela UFRGS. Atualmente faz parte da Direção da Seção Sindical – Sinasefe IFSC. Atua na Corrente Sindical Unidade Classista.

2 – EVANGELISTA, Ana Paula. Uma década de reconfiguração da Rede Federal: O que é preciso? Minimizar, expandir, reduzir ou fundir? In: Revista Poli, Rio de Janeiro, Ano XI – Nº 61 – nov./dez. 2018.

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